quinta-feira, 28 de maio de 2009



Mais relatos do prof. sidão, com uma novidade: clique aqui para ver o álbum das fotos da Missão a Maputo. Clique aqui para ver outro álbum.

Diário da missão a Maputo, 27 de maio de 2009

08h30h - Hoje saímos um pouco mais tarde, ao contrario do dia anterior, fomos ao e no norte de Maputo, precisamente fomos a Marracuene e Costa do Sol. Fomos novamente em duas caminhonetas 4x4, creio que sem elas ficaria difícil chegar aonde fomo. Fomos primeiro visitar a Unidade Produtora de Alevinos, iniciativa única em Maputo, em Moçambique há outras. Para chegar lá percorremos caminhos tortuosos, em solo arenoso, fofo, ora por capinzeiros de um lado e de outro passando por pequenas vilas, onde mulheres expunham produtos, sobre toalhas colocadas sobre o chão, para tentar vender tomates, cebolas, alfaces, biscoitos. Cruzamos por edificações sendo reconstruída, herança do período colonial, escolas infantis, repleta de “miúdos”. De fato são “miúdos”, como toda criança, lindas, em seu frescor, energia, e alegria que os fez levantar a mão para nos dar um alô risonho. Uma vista de uma vida dura, mas também se via uma vida digna, vimos nessa nova etapa pobreza, não miséria.

Abdul Magid é o nome de um dos proprietários da Unidade. Ele e mais quatro irmãos financiam o empreendimento. Eles herdaram a propriedade, nela há agricultura, de tudo um pouco, gado e a Unidade. Dos quatro é o único que trabalha no processo de produção. Abdul é descendente de árabe, o primeiro proprietário foi o seu avo, Sr. Jafar, ainda no século XIX, era conhecido como o rei das rosas, produzia inclusive rosas pretas! A Unidade, portanto, é de propriedade familiar e conta com empregados, portanto um empreendimento privado. Todo o financiamento veio da produção das culturas e da pecuária, obtém do governo apoio técnico. Há também o acompanhamento, ainda irregular, do responsável do IDPPE no município, o Pires, outro jovem articulador, fazendo o papel que o Inácio terá que realizar no Norte do estado do Rio, no tocante aos territórios da política da SEAP.

Observou-se que o tipo de produção é muito parecido com o que havia no Brasil, há mais de vinte anos, que há uma grande defasagem e diferenciação tecnológica, que isso deve ser levado em consideração. Não se deveria, analisou-se tentar qualquer colaboração que não levasse em consideração que a consolidação daquele empreendimento deva ser feito aos poucos e com as condições locais e moçambicanas para o setor. Eu fiquei muito bem impressionado com o que vi, contei doze tanques de 10 metros por cinco metros, com profundidade entre 1metro e 1,5 metros. Importante, a Unidade não faz engorda, como diz o nome, produz Alevinos, tilápias bem jovens.
Em seguida, voltamos às estradas tortuosas, voltando para Maputo, paramos um pouco na Costa do Sol, onde vislumbramos imenso recuo da maré da Barra de Maputo, algo parecido com o fenômeno de São Luiz. Disseram que nem sempre é assim. Isso permitiu vermos os pescadores fazendo manutenção de seus barcos, todos de madeira e a maioria a vela, poucos com motor, eu não vi qualquer. Perguntei a uma simpática dupla de jovens pescadores, que suavam para pintar o casco do barco, se tinham problemas de apodrecimento decorrente de animais diversos. Eles confirmaram, mostrando outros sem manutenção com problemas nos cascos. Eles mesmos constroem seus barcos, em suas casas, orientados por mestres. Há uma associação de mestres. Nem pensar em afirmar que se trata de pensamento coletivo, visto a ligeireza da conversa, foi dito por uns quatro pescadores que eles preferem que os barcos tenham motor, para não depender dos ventos. Eles precisam do barco, não podendo fazer pesca de arrasto de praia, pois a incidência de camarões e peixes é maior e mais rentável, ao redor da Ilha de Inhaca (aqui essa palavra não tem o significado de indolência ou preguiça), que fica uma distancia que se percorre normalmente em uma hora, mais ou menos, das margens da Costa do Sol.

É ressaltado pelo pessoal do IDPPE o obvio: que a Barra sofre menos com a poluição, seja sonora, seja de óleo diesel, exatamente pelo fato de não usarem e não terem mesmo condições de adquirirem motores. Ficamos de retornar mais tarde e novamente fomos para as caminhonetes e novamente fomos pelas estradas tortuosas, ainda mais, com cada vez solo mais arenoso, fofo, que sem o 4x4, como disse não seria possível chegar ao estuário aonde chegamos. Fomos a uma localidade de denominada Montanhana, do distrito de Marracuene, o mesmo da Unidade de Beneficiamento de Alevinos. Descemos das caminhonetes, ao lado da barra de Maputo, num lugar sem casas, muito bonito, e fomos orientados a arregaçar as calças ( eu não porque estava de bermuda), para poder atravessar o estuário. Foi a primeira vez que coloquei os pés nas águas do Oceano Indico, mesmo que numa barra. Foi emocionante, venho Ghandi à minha mente. Cada um experimentou a água de um jeito. Andamos uns 15 minutos e chegamos a um pequeno lugarejo, onde havia uma movimentação de pescadores e mulheres que não estão envolvidas na pesca direta (aqui elas não são consideradas pescadoras caso se dediquem a serem compradeiras ou vendedeiras). A reunião foi debaixo de uma ampla arvore, com tempo fresco de outono, numa elipse que não fechou. De um lado nossa missão somada a delegados e funcionários do IDPPE. Do outro lado, pescadores da comunidade, dirigentes da Associação dos Pescadores de Montanhana. O presidente e o vice presidente estavam com camisa e boné da Associação, No peito pudemos ler: Viva o 1o de Maio. Depois de já estar andando a reunião chegou o presidente do Conselho da Comunidade Pesqueira, fundada há três meses.

Todos se apresentaram em seguida a reunião foi aberta pelo jovem delegado do IDPPE, Pires, explicando a busca de uma colaboração entre Brasil e Moçambique. Mauro dirigiu-se aos pescadores, principalmente para dizer querer ouvi-los. Foram feitas varias falas, a primeira foi do pescador mais antigo presente, entremeado pelo presidente da associação, ambos se comunicaram no dialeto Xangana (penso que esteja denominando- o corretamente) . Pires ia traduzindo. Eles falaram olhando para o jovem facilitador. Denote-se que esse dialeto é falado em vários lugares da África. Foi muito tocante o momento, o cenário, as faces tensas e um cansaço claro. Não demorou para que outro jovem, a principal liderança deles, considerado por todos nos como a maior delas que contatamos até então. Ele reclamou de varias coisas com assertividade e muita clareza: primeiro, que estavam ali desde as 7 horas da manha, para receberam outra delegação estrangeira, de um grande projeto internacional ligado AA FAO, de boas praticas pesqueiras e beneficiamento, sediado na Tanzânia; segundo que souberam em cima da hora que nos iríamos aparecer. Terceiro, que eram 14h e que estavam cansados e muitos com fome ( a maioria vai e vem todo dia, não reside no local). Quarto lugar que não acreditavam nas promessas do governo, que ele era da FRELIMO, mas nem por isso deixaria de se queixar que a comunidade estava abandonada, que não possuía eletricidade, acesso viário etc.

É bom que se diga, a bem da verdade, que o pescador mais antigo, em Xangana, houvera falado sobre o grande problema do escoamento da produção. Diferentemente da comunidade visitada no dia anterior, da represa, eles dependem de compradeiras – que não são da comunidade – que vem comprar o produto. Alem disso reclamou que no tempo das chuvas, ou quando já alguma excepcional, fica impossível qualquer movimentação, seja para ir ou vir na região. Voltando ao jovem líder, ele reclamou fortemente da ausência de energia elétrica na comunidade, sendo que as vizinhas já possuíam e que isso iria demorar ainda muito tempo (quatro ou cinco anos). Foi levantado se ele possuía apoio em sua fala, pelo Ernesto do IDPPE, dois ou três outros dos presentes, fizeram coro ao debate. Muito bem, portanto as questões debatidas a seguir dos depoimentos foram as seguintes:

a) Energia elétrica, senão aquela originaria de redes, pensar em alternativas, como a energia solar;

b) Sobre a dificuldade do acesso por conta do estuário, Mauro bateu na tecla de não pensarem em curto prazo e tentarem fazer qualquer obra, pois ele é o responsável pela reprodução do estoque;

c) No debate foi levantado por alguns dos pescadores que o estoque estava diminuindo visivelmente e eles estavam debatendo se não seria o caso de construir uma Unidade de Criação de Alevinos;

d) Foi debatida também a necessidade de se ter refrigeração, pois isso os coloca na mão dos compradores. Ressalte-se que fruto do projeto citado anteriormente, sediado na Tanzânia, esta sendo construída uma unidade de tratamento para o pescado que chegar. Isso permitiu reflexões paralelas se não se poderia construir a prazo um centro integrado de pesca artesanal, segundo a filosofia de centros de pesca ou do CIPAR.

e) O debate político foi importante, pois colocou no palco a discussão sobre o gerenciamento do conflito, Particularmente o Mauro, frisou que deveriam exercitar a cidadania, a pressão ao governo, com propostas concretas, exercitando a pratica de representação participativa da associação e do Centro recém criado. Ou seja, de que as energias das reclamações ao governo deveriam ser focalizadas na busca de uma gestão social e compartilhadas dos recursos pesqueiros (essa qualificação é minha)
Ao final foi feito discursos do lado da missão e do IDPPE, para ser finalmente finalizado pelo presidente da Associação.

Comprometeu- se que as comunidades visitadas e a de Montanhana, deveriam estar nas reflexões do plano bilateral de cooperação que será elaborado ate sexta feira. Findo o debate, retornamos para as duas vans, novamente os caminhos tortuosos, e deparamos com a insólita e linda cena de um professor, debaixo de uma arvore, estava dando aula para crianças, entre sete e 10 anos, todas quietas, prestando muita atenção. As duas caminhonetes pararam recuaram e nos registramos nas maquinas o momento. Saímos rapidamente, pois as crianças começaram a se desconcentrar e ficamos temerosos em prejudicar o desenvolvimento do aparentemente talentoso professor. Cena rara! Ta registrada e esta no nosso álbum de fotos.

Finalmente, a caravana foi concluída na Costa do Sol, onde conversamos com um dos lideres do Centro Comunitário dos Pescadores, que muito rapidamente nos colocou a par dos principais problemas: refrigeração do pescado, acesso ‘a pesca, por conta dos mares, comercialização. A conversa foi muito rápida, seria temerário até concluir com alguma objetividade o que penso que seria o pleito, Com certeza foi apenas uma troca de impressões, diferente das analises, desenvolvidas tanto na Unidade de Beneficiamento, como na comunidade de Montanhana. Eram 15h30minh quando retornamos ao hotel, tomamos um banho e fomos almoçar ‘as 17h. Eu , Mauro e João, Luiz não foi por conta de ter ido visitar o Instituto de Desenvolvimento da Aqüacultura. INAQUA.

Embora cansados e com fome, foi inevitável que conversássemos sobre os desdobramentos para o dia de amanha. Depois da reunião protocolar com o ministro e o embaixador; visita ao Laboratório do Instituto de Fiscalização, da visita á Escola de Pesca e finalmente ao Instituto de Investigação e Estatística, depois dessa maratona matinal – vespertina inicial, ‘as 14h deveremos estar no IDPPE para negociar os elementos, conceitos, ações que deverão constar no plano de colaboração, levando em consideração a proposta enviada pelo ministro moçambicano ao do Brasil.
Há muita duvidas, claro, pois a responsabilidade é grande em propor um plano exeqüível, com duração de um ano e meio, ou menos, contando com 300 mil dólares, e que também garanta um legado. Parece que teremos que erigir artefatos, articulados com ações comunicativas e educacionais, ancoradas em instituições moçambicanas em parceria com brasileiras.

Conversamos também sobre a oportunidade de se propor amanha à tarde, rodadas paritárias, intercaladas com analises de cada um dos dois países, de sorte poder propiciar o livre debate, ao mesmo tempo a assertividade das propostas de cada pais.

Isso tentaremos amanhã, e que Deus nos ajude, e ele há de ajudar!

Sidão

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